Até que eu me divirto!

mas que deixei de acreditar, isso eu deixei!

7.31.2005

O que eu nem sei mais...


Apague o cigarro e levante a cabeça, por que eu quero falar olhando em seus olhos.
Deixe de tremer, gaguejar, fugir. Foi você quem pediu, não foi? Foi você quem acusou, não? Foi você quem quis saber, certo?


Alguma coisa a gente tem que amar, é verdade. E alguma coisa a gente sempre há de amar. Conquanto, não me venha falar em frieza, insensibilidade. Eu também carrego sangue em minhas veias.


Eu amo o passado, a lembrança. Amo tudo o que foi bom e há de ser eterno, e cada dia mais perfeito, romanticamente modificado por nossa traiçoeira memória.
Futuro? Amo imaginar possibilidades improváveis, arquitetar roteiros, mesmo sabendo que nada irá acontecer.
Não fale de presente. O melhor do agora é poder lembrar do ontem, é poder pintar imagens irreais para um falso amanhã.


Agora sim. Sem o maldito cigarro fica bem mais fácil para conversarmos.

Espera! Quem é você pra me chamar assim? Até agora eu estava sendo educado. Mas sim, tudo bem. Talvez eu seja mesmo um coitado e deva mesmo morrer só.
Cada um de nós tem seu tema pessoal pra viver.
À Shakespeare, o amor;
À Álvarez, a morte;
À Salomão, vaidade;
À mim, solidão
.


E aí? Resta uma dúvida em mim: qual tem sido seu tema? Egoísmo? Mesquinharia? Rejeição?
Enxergue a verdade! Coitados somos todos nós, jogados ao esmo, ora reclamando, ora, iludidos, achando tudo perfeito, até o momento em que desabam os castelos.


Agora pode acender novamente seu cigarro.
Vou-me.


Soundtrack: Map, Yeah Yeah Yeahs.

7.13.2005

Arco-Íris em dia de sereno e sol

- Alô?
- Alô. Sou eu.
- Hnn... oi, tudo bem?
- Comigo sim, e com vc?
- Também, só com um pouco de sono.
- Escuta, eu estava pensando, será que nós não poderíamos...
- Poderíamos...?
- Sei lá, de repente sair, conversar um pouco, talvez...
- Você não conseguiu aceitar, não é mesmo?
- Aceitar ao que?
- Tudo, que não existe mais...
- De uma hora para outra, todas as promessas, todas as juras...?
- É.
- Tudo não passou de mentira?
- Não! Não era mentira! Mas acontece que certas verdades mudam com o tempo!
- E certas pessoas...
- E certas pessoas são substítuíveis.
- É. Lembro de te ouvir falar. Antes eram os outros, e agora, eu.
- Não, você não foi como os outros, você não é.
- Não?
- Não!
- Então diga o que eu sou! Diga quem sou!
- Você...
- Quem sou eu, que te ligo no meio da noite, só para te ouvir dizer que certas histórias acabam sem nem mesmo um porquê?
- Alguém especial, mas chegou o fim.
- É, apenas isso, não? O fim. O fim de tudo, o fim do arco-íris, como se fosse simples...
- Não foi simples para mim, entenda!
- Com certeza foi mais fácil para um dos lados.
- Desculpa.
- Por que?
- Por tudo.
- ...
- Boa noite.
- Tá. Até mais.
- Sorte.


Agora feche os olhos.Diga, em quem você pensou?


Soundtrack: Hug Bubble, Placebo.

7.08.2005

A justiça não é cega. É gorda.

Os cachorros sempre dão o sinal. Começam a latir feito loucos, mas não latem como se estivessem caçando algo. É um som característico, como se claramente estivessem chamando por seus donos.
A mãe ainda não havia arrumado seu próprio prato de comida quando chamaram ao portão.

- Pois não?
- Senhor... (prolongando o “or” enquanto lia no papel em suas mãos), senhor Charles Fagner se encontra?
- Almoçando, mas já vou chamar. Quem deseja?
- Oficial de justiça, senhora.

- Pra você. E eu quero explicações!
Ele levanta e vai correndo vestir uma camisa antes de ir atender ao chamado.
- Quem é que quer falar comigo essa hora?
- O que foi que você aprontou?
- Eu? Nada, por quê? Quem diabos quer falar comigo?!
- Tem um oficial de justiça chamando por você no portão, e ainda tem a coragem de me dizer que não aprontou nada?
- Oficial??? Que história é essa?!

- Assine aqui, por favor
- O que é isso?
- Intimação.
- Hã?
- A Senhora Margarida está lhe processando pelo artigo 143 do Código Penal Brasileiro, e o senhor está sendo intimado a depor, no dia indicado neste papel.
- Artigo 143? Dá pra você ser ao menos objetivo e falar logo tudo de uma vez? Meu almoço está esfriando...
- Calúnia & Difamação. A acusação dá conta de que o senhor teria escrito algo sobre ela, uma afirmação, algo que, cá entre nós, todos sabem, mas, creio, ninguém possui provas, em um certo fórum na internet.
- Dá cadeia?
- Só se o senhor não pagar a indenização, caso seja condenado – o que é quase certo de acontecer.
- Nossa, como você é animador, não?
- Muitos anos no trabalho. Agora assine logo isso. A Turma resolveu processar todo mundo que falou, pensou e agiu, ou melhor, falou, pensou, agiu e, principalmente, escreveu contra eles.
- A Turma?
- Não quer que eu fale para o senhor quem seria “A Turma”, não é? Sou funcionário público, meu amigo, e mesmo não sendo municipal, eu é que não vou sair por aí falando mal deles. Vai saber...
- Hnnn! A Turma! Só podia!
- Cuidado com o que fala, rapaz!
- Ops! Sim, sim. Obrigado e boa tarde.
- Boa tarde.

O homem não deve defender idéias as quais não tenha absoluta certeza de serem verídicas.
O homem não deve escrever verdades se não possuir formas materiais com quais as prove.

7.01.2005

Antes e agora (ou "do que se esquece com o tempo, parte 2")

Ah, velho! Como você é relapso! Esqueceu a calça preta no mesmo lugar de sempre, na caixa, dentro do guarda-roupas, que é para as traças não furarem. Aliás, por falar em guarda-roupas, percebo que você levou consigo a mala que meu irmão nos emprestou, para que pudéssemos trazer as belas camisas que comprei para você durante a viagem que fizemos, meu irmão, Zezé, os filhos deles, você e eu, naquela primavera de 81.

Lembra como você era quando novo? Seu jeito calado, seu olhar perdido, seu ar de quem não sairia do lugar, não importando o quanto o mundo poderia tremer;
Lembra de quando fomos apresentados? Ou de quando sugeriram que poderíamos nos dar bem se namorássemos? Eu ri alto. Você disse "talvez sim".

Olha essas fotos...
Deus! Eu realmente não me lembrava disso!
Nada ficou das suas fotos só, das suas fotos com os amigos do baralho, ou com os poucos amigos de quando jovem. Ao contrário, aqui, ainda sobre a cama, apenas nossas fotos, nossa história comum, e todas as fotos que tiramos juntos.

Nessa aqui, Zezé e eu. Todos (exceto você, é claro), me disseram que eu parecia abatida após a gripe que não me permitiu ir ao colégio durante uma semana. Talvez eu estivesse sim abatida, mas não estive gripada...
Éramos jovens demais. Você não estaria preparado. Você nunca esteve. E nem nunca soube disso tudo.
E eu, jamais conseguiria outra vez.
Deve ter sido mais fácil para você assim. Filhos poderiam ser um problema.
Para que lamentar, não é mesmo?


Carlos, cuide da sua pressão. Os remédios você esqueceu, mas, cedo ou tarde, vai acabar lembrando. Mas se há algo que não podemos esquecer é: sal faz subir, maracujá faz cair. Portanto, evite os dois.

Meu velho, como me orgulho! Você, que nunca foi dado a tomar decisões, de repente abre a porta e vai embora...
Sim. Você enfim conseguiu aprender.