Até que eu me divirto!

mas que deixei de acreditar, isso eu deixei!

9.02.2006

A Ilha - Dia #04: 28 de agosto de 2006

“Vâmo nessa, pessoal?!”

Sou um dos que mais tem pressa. A saudade da garota-mais-cheirosa-do-mundo chegou ao ponto em que telefonemas de bom dia / boa tarde / boa noite já não são suficientes, mas estou no meio do mato, e isso é tudo o que posso fazer.

Ainda precisamos mudar as roupas, voltarmos aos já imundos trajes que estamos usando para cruzar essa porcaria de matagal. Precisamos de um café da manhã (uma barra de cereal para três). Precisamos escovar os dentes nesse filete de água para retirar o gosto de cabo de guarda-chuva e da mistura fermentada de arroz, sopão e macarrão ingerida no fim da tarde passada.

Mas logo estamos de volta, contornando pedras, ouvindo os malditos macacos, embrenhando no mato, contando as mãos, furando as mãos, trançando os pés, criando bolhas... e o pé direito do lixo de bota que me foi emprestada pelo marido de minha irmã (Valter, normalmente chamado de “Válti”) está com a sola descolada, amarrada por pedaços finos de cipó.
*************


APRENDA ISSO: se em alguma situação você tiver que passar mais de 24 horas ao lado de militares ou ex-militares, esteja preparado para ouvir, a cada cinco palavras, expressões como “bizu”, “jangal”, “sanhaço” e outras, cada uma mais estranha e sem lógica que a outra. E quando falo em “a cada cinco palavras”, são cinco palavras MESMO.
*************


Pouco após as 10 da manhã, sem um gole de água nos cantis, somos obrigados a cortar pedaços de bambu atrás de uma água com gosto amargo e cheiro estranho, mas que, no fim de tudo, acaba sendo de grande valia. É ÁGUA, mermão! E é o que importa.

Algum tempo mais e avistamos o paredão de pedra que deveria estar acima do sopé, onde deveríamos ter chegado no começo da tarde de ontem. Então... é isso... pegamos o caminho errado, andamos MUITO mais do que deveríamos, mas a boa notícia é que o topo não deve mais estar tão longe assim de nós.
Agora é só subir essa outra parede de pedra menor, com essas plantinhas cheias de espinhos, na mão, e... ESPINHOS? Na MÃO?! Isso é jangal! É muito sanhaço! Certamente não é o bizu!
Alan “Comandos em Ação” Kronemberg, o homem que vai a frente dessa furada cada vez maior, acaba desistindo – depois de se furar mais do que boneco de vodu e deixar seus braços com a aparência de que ele acabara de brigar com uma meia dúzia de jaguatiricas.

Vamos margeando pela direita, e andando, e subindo, e andando, e subindo... e são meio dia e qualquer coisa, e minha barriga ronca, e acho que... CHEGAMOS, mas a mata é fechada e não dá pra ter certeza porque é mata fechada. E para melhorar minha sorte, começa a chover (William acha que é só aqui em cima, eu acho que vou morrer).
Andamos um pouco mais em busca de alguma clareira, mas NADA. Bem... pelo menos não há mais para onde subirmos, mas, no meio desse sereno, não consigo me alegrar com esse fato.

13h20: Resolvemos iniciar o caminho de volta.
A chuva aperta.
Parede de pedra à nossa frente – teremos que fazer rapel e – olha aí que beleza! – é esse não é o momento ideal para me lembrar que tenho medo de altura, certo? Pois me vem a mente o dia em que desconsiderei a idéia de acompanhar um grupo de amigos em suas aventuras com rapel, eu, numa espécie de festa ou sei lá o quê, preso com todos os equipamentos de segurança, tentando descer do 3º andar de um prédio de uma escola, e meus joelhos travando, minha perna não me dando atenção, e eu desistindo. E – olha aí que legal! – dessa vez, a segurança é UMA corda, um TRONCO de árvore e só. Mas não há o que fazer, e de repente lá estou eu, com minhas pernas bambas e joelho semi-morto, queimando a mão esquerda em um cipó e a direita numa corda até poder chegar ao chão.

E ainda mais uma vez, depois de andarmos mais um tempo, uma parede maior ainda.
Estou tonto e com fome, e aqui é um bom lugar para dormir, uma toca certeira onde a chuva não alcança, e tem lenha seca por perto. Vamos parar, por favor! Amanhã cedo a gente continua. PRECISO estar em casa amanhã... 3 meses de namoro, saca? E ela lá, e eu aqui, e o delicioso perfume dela, e esse nosso cheiro de azedo... eu não só quero voltar, eu PRECISO voltar... eu REALMENTE preciso voltar.
*************


Como se faz para espantar o frio e abstrair-se do desespero crescente? Acenda uma fogueira, cozinhe seu arroz-com-sopão-com-macarrão-e-caldo-de-carne e divirta-se cantando coisas da época em que Raça Negra (a Top vâmo-bater-lage-lá-na-cara-do-Geraldo-no-domingo-porque-vai-ter-angu-a-baiana-de-graça) era o treco que mais tocava nas rádios do país inteiro e vendo alguém que de risada semi-mecanizada (um estalado e pausado ”Rá! Rá! Rá!”) cantando e dançando “Ela tá dançando e o pimpolho tá de olho / cuidado com a cabeça do pimpolho”.

Rá! Rá! Rá!
Não suporto mais essa merda, e eu quero ir embora daqui.

1 Comments:

  • At 3:49 PM, Blogger Tiago Agostini said…

    rapaz, eu nao entraria nessa, nem a pau. meu medo de altura é maior q a vontade de me formar. quer dizer, creio eu...

     

Postar um comentário

<< Home